Aqueles que deviam aquecer o teu coração
são, na realidade, os que queimam a tua alma sem pudor, atormentando ainda a
tua mente e despertando, por conseguinte, a cólera no teu coração.
É ultrajante saber o quão absurda é a
condição daqueles se autodenominam vítimas do destino. Serão mesmo vítimas ou
seus próprios carrascos? Vidas perfeitas não existem, é uma distante utopia. Afinal,
quem são esses mártires? Tantos que sofrem muito mais e mesmo assim honram a
sua existência, lutando, superando as limitações que lhes foram impostas. Entre
os espinhos, por vezes, permanentes, ainda arranjam tempo para sorrir, para
inspirar. Não procuram a piedade alheia. Não querem ser reconhecidos pelas suas
derrotas, mas sim pelas suas vitórias. Assim, são os grandes guerreiros. Esses
são os verdadeiros heróis. Sangram, choram, gritam em silêncio, tropeçam, caem...
Não se entregam à lamúria dia após dia. Ao invés disso, erguem-se, lambem as
feridas, sacodem as roupas empoeiradas, arregaçam as mangas ensanguentadas e
prosseguem cambaleando. Arriscar é melhor. Viver com pena de si mesmo é uma
forma atroz de comunicar a sua morte no mundo dos vivos. É deitar fora o bem
mais precioso de todos e que muitos já perderam injustamente. Fazer do
infortúnio um orgulho modesto é, sinceramente, um ato insano. Celebram o que a
maioria prefere esquecer ou abandonar de vez.
Aqueles que se queixam da própria vida e
que nada fazem (de concreto) para a mudar, verdadeiros adeptos da inércia e que
vivem da autocomiseração, não são vítimas, são carrascos. Querem afogar-se no
seu próprio sofrimento e ainda tentam sufocar aqueles que lhes prestam socorro.
Culpabilizam, muitas vezes, tudo e todos
pela sua situação. Não procuram soluções, uma saída; focam toda a sua energia e
tempo noutros possíveis problemas, criam cenários irreais e desfavoráveis à sua
felicidade, lançam pedras no seu próprio caminho. Entretanto, buscam aplausos
pelo seu fracasso, derrota, e não pelo seu triunfo. Vivem das migalhas que a
vida pode oferecer. Não são e nem querem ser autossuficientes. Isso requer
gerir a própria vida. Isso dá trabalho. É preferível sobrecarregar o familiar
ou amigo mais próximo.
Um ser humano adulto que não é senhor da
sua independência é, de facto, uma albarda pesada na vida dos outros. Podem
discordar, mas essa é a pura verdade. Aprender a lidar com isso é árduo, requer
uma força quase sobrenatural. Essas pessoas que se encostam noutras, que adoram
viver da sua interminável desgraça são tóxicas. Sugam a tranquilidade daqueles
que as rodeiam. (Não me refiro a doentes crónicos com mobilidade reduzida ou
débil condição física ou mental devidamente comprovada, vítimas de acidentes
graves que perderam sem o seu consentimento a sua mobilidade e/ou liberdade.)
Superar as adversidades da vida é uma
qualidade humana. Fazer da dor júbilo. É doentio! É execrável! Refiro-me
àqueles indivíduos que preferem encontrar mais problemas para além daquele que
já têm quando é nitidamente possível encontrar uma solução. É tão fácil ser-se triste,
não é? A felicidade dá trabalho. Viver não é para todos, existir sim.
Os seres que não considero verdadeiramente
humanos infligem dor a si mesmos para além daquela que outrora sofreram pelas
mãos de outrem. Perante tanta imbecilidade, pergunto-me: Atentar contra a
própria existência fará sentido? Não! Não controlamos o meio que nos circunda. É
um facto. Somos responsáveis, no entanto, pela forma como isso nos afeta.
Valerá a pena culpabilizar o destino constantemente? Não! Isso não mudará
absolutamente nada. O bom discernimento é tão vital quanto o ar.
A estupidez humana não tem limites. A
paciência, por outro lado, tem. Não podemos salvar quem não quer ser salvo.
Aprendemos isso ou enlouquecemos. Ninguém te pode obrigar a dar o que já deste
e se esgotou. Podemos orientar, dar bons conselhos, não podemos salvar. Temos
de aceitar o que não podemos mudar. É uma decisão dolorosa, mas necessária.
Numa determinada fase das nossas vidas, é fulcral soltar as amarras sem
sentimento de culpa.
Evidentemente, abomino pessoas que fazem
da sua tragédia, uma peça de teatro. O sofrimento não deveria fazer de ninguém
um herói, o que o deveria imortalizar seria a força exibida a posteriori.
Saborear a vida não é uma obrigação, é uma necessidade negligenciada por
muitos.
A vida resume-se a dias bons e a dias menos bons. Quem não quer viver dignamente (e pode), não deveria infernizar aqueles que sempre lutaram pela sua felicidade e bem-estar. Quem vive bem com o seu descontentamento e orgulha-se disso não deveria importunar aqueles que não se identificam com esse estilo de "vida". Basta! Chega! Não! Adeus! Palavras que libertam. Ninguém tem o direito de nos roubar deliberadamente a alegria dos nossos dias. Libertem-se!
Existem, assim, pessoas inspiradoras, banais, vazias, malévolas, e outras tóxicas.
Nélson José Ponte Rodrigues
27 / 28 - 05 - 2017
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