Jornalista: Luís Pessoa não aguentava mais a precariedade do seu país. Aquele que supostamente o deveria respeitar e apoiar, extorquiu não só o seu dinheiro e dignidade, mas também a sua esperança. A vida perdeu todo o seu sentido quando os seus sonhos lhe foram, impudicamente, arrancados. Desolado e amargurado, partiu de madrugada para um outro país. Contudo, antes de partir, escreveu uma carta cujo intuito era despertar mentes e corpos moribundos. Não queria, portanto, abandonar o seu país em vão... Nessa carta que enviou para um jornal local, descreveu o que há muito tempo estava entalado na sua garganta.
“Caros irmãos, não aguento mais! O Sol deixou de brilhar na minha vida…. Embora tenha tentado manter a calma e o otimismo, não resisti. Decidi partir. Todos os homens têm o seu limite! Eu já atingi o meu. Não sou cobarde nem fraco. Sou realista e bastante sensato. Vejo, todos os dias, um povo que é, constantemente, assaltado e ludibriado.
Este governo que nos domina, já não nos
representa, sufoca-nos. Não somos cidadãos, somos meros contribuintes que
enchem os cofres do Estado. Só servimos para isso: pagar.
Após tantos sacrifícios, só vejo
escuridão. Neste infindável abismo, um autêntico beco sem saída, temo um novo
amanhecer. Conheço, infelizmente, o lema da pobreza: “Não vivo hoje para viver amanhã.”
Por outras palavras, temia não ter dinheiro suficiente para pagar as minhas
contas no dia seguinte. Vivia numa interminável inquietação. O nosso “amável” governo
exige tanto de nós, mas não nos dá condições para cumprirmos com as nossas
obrigações. A definição de democracia, neste país, perdeu o seu significado
original. Qualquer dia, democracia e tirania serão palavras sinónimas.
O povo que
alimenta o próprio carrasco é algo que jamais entenderei. Muitos vivem “bem” mergulhados
num desconforto e ansiedade incessantes. Eu não. Recuso-me a desistir dos meus
sonhos. São eles que me mantêm vivo e mentalmente são.
Vivemos numa
sociedade decadente e ignorante, que até prescinde da sua própria felicidade,
pois prefere permanecer na sua zona de conforto, muito embora essa seja
desconfortável. Vivem insatisfeitos, rezingões e frustrados, mas, mesmo assim
não reivindicam a sua própria felicidade.
Não abandonei o meu país… Eu fui
abandonado pelo meu país. Eu não me sinto um cidadão no meu próprio país. Sou um
mero instrumento, um número, um escravo. Trabalhamos tanto e só conseguimos
juntar dinheiro para comer, pagar as contas do dia a dia, e impostos. Essa é a
nossa triste realidade. Eu não quero, simplesmente, sobreviver, eu quero e
mereço viver.
O António, esse meu grande amigo, e a
sua família sobrevivem na rua. Tinham tanto. Perderam tudo! A vida tem destas
coisas. Não podemos tomar nada por garantido, definitivamente. Este governo
ajuda somente os grandes, os cúmplices. Existem dois pesos e duas medidas. Os
senhores deste país que, na verdade, não o são, usam e abusam do seu poder.
Roubam, por vezes, de forma escandalosa, os próprios vassalos e esses continuam
fiéis ao tirano que lhes rouba o pão. Nós comemos as migalhas. Eles comem a
fornada inteira. Enquanto uns se banqueteiam, outros contam tostões, ou vivem
na miséria.
Todos nós sabemos, eu creio, que o
nosso “desgoverno” tem um único culpado: Nós! Aqueles que elegemos são os
nossos representantes. Onde está o espírito patriota do nosso país? Não o vejo.
Vivemos numa sociedade corrupta e amoral. E ninguém faz nada! Os lesados
permanecem numa masmorra condescendentemente.
Os nossos governantes
tratam-nos como escravos. Na realidade, nós somos os culpados. Quando não somos
respeitados, perdemos a nossa dignidade e amor-próprio. Não devemos tolerar
isto. Quem cala, consente! Certo? É revoltante, nojento e humilhante o estilo
de vida que, supostamente, temos de aceitar no nosso amado país: sem metas, sem
ambição, sem reconhecimento.
Acredito que
muitos de nós tenham ambição, mas, infelizmente, não têm condições,
principalmente, financeiras para alcançar e agarrar quaisquer metas.
Vivemos num país
cujo governo apela à honestidade, lealdade e ao compromisso. Contudo, age de
modo contraditório muitas vezes…demasiadas.
O governo está contaminado. Todos nós
sabemos o que devemos e podemos fazer. Ninguém faz nada! É incrível! Manifestações
sem fulgor são motivo de chacota entre os grandes. Somos os bobos da corte. É ultrajante!
Não consigo fazer parte desta
tripulação que rema numa direção, enquanto o capitão, conscientemente, rema
noutra completamente oposta. Esse capitão só tem em consideração os seus
próprios caprichos e vontades que se encontram no alto mar. Os tripulantes
deste barco sabem à partida que jamais chegarão a terra firme, mas mesmo assim
continuam a remar em vão. Assim é o nosso país! Enquanto uns colhem as maçãs,
outros comem-nas.
Devemos ser bons e honestos, nunca
parvos e " palhaços".
Afinal de contas,
não somos cidadãos, somos escravos. Está na hora de enfrentar a realidade. Temos
agido como "cordeiros". Seguimos as ordens de um lobo mau disfarçado
de pastor. Nós sabemos que estamos a ser enganados e, mesmo assim, não fazemos
nada. Não agimos em prol do nosso bem-estar. É um ato de extrema cobardia e
demência.
Devemos sempre lutar contra o que nos
faz mal e zelar pelo nosso bem-estar. A vida, por vezes, é tão simples! Se
estamos mal, temos de procurar uma solução. É imperativo erradicar o que gera
esse mal-estar. A inércia, o ingrato
comodismo e a preguiça intelectual prejudicam sempre a nossa felicidade: o
nosso bem-estar, a nossa tranquilidade. Sem ação, principalmente, nos momentos
de dificuldade ou angústia, nada mudará. Milagres acontecem quando agimos.
Quando pagamos
algo, desejamos e pretendemos ser bem-servidos, principalmente, quando o
serviço é dispendioso e, supostamente, teria uma elevadíssima qualidade. Certo?
Pagarias um determinado serviço se soubesses à partida que serias mal servido?
Em poucas
palavras, consigo descrever este e outros governos que têm vindo a assombrar a
nossa existência: sacrifícios, promessas vazias, descontentamento contínuo,
corrupção, miséria. Qualquer dia, os senhores do nosso país venderão o nosso
país.
Perante tanta
hipocrisia, desleixo e sacanagem, acredito que os nossos governantes façam de
tudo em nome da ganância e do seu bem-estar.
A honestidade é
uma qualidade que está em desuso. Aparentemente, tudo tem um preço.... Tudo!
Alguns preferem um bolso cheio a qualquer custo. A honestidade é, assim,
facilmente desvalorizada. Vale tudo! Cada um por si! Uns roubam enquanto outros
assistem.
Não há união. Não há um objetivo
comum nesta nação. Assim, estaremos condenados.
Estejam atentos
ao que se passa. Questionem a realidade. Não permaneçam apáticos! Não percam a
vossa voz! Não engulam afirmações ou respostas incoerentes. Procurem sempre a
verdade.
Eu vou partir com o coração partido.
Desiludido com a minha própria nação, espero um dia regressar. Até breve!” - Luís
Pessoa <10-06-2014>
Jornalista: Destroçado, Luís partiu.
Desde então, nada mudou. A carta foi publicada e, inicialmente, causou alguma
polémica. Contudo, foi sol de pouca dura. Todos nós sabemos que as polémicas que
envolvem o nosso governo sucumbem rapidamente. Após tantos assaltos aos
contribuintes e tanta deslealdade, a odisseia continua.
O
governo pode agir de uma forma leviana e incompetente quando lhe apetece. A
culpa, essa bastarda, é sempre órfã.
Qual é o desfecho desta história? O contribuinte
continua a pagar pelos erros ou luxos do governo e restantes cúmplices. Sim,
esta corja prolífera. Até quando viveremos assim!? Depende de todos nós. Todos.
A união faz a força, não se esqueçam!
"Shame on you if you fool me once. Shame
on me if you fool me twice..."
Nélson José Ponte Rodrigues
06-08-2014
Tratando-se de um texto meramente
ficcional, qualquer semelhança com a realidade é uma simples (e inoportuna)
coincidência.
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